sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

CANTINHO DO CÉU

Em algum domingo do último mês de dezembro, logo após chegar em casa da pelada dominical, senti uma sede aguda, daquelas de deixar a goela bem seca. Era sede de cerveja. Fui pensando qual seria o bar da vez, a Tijuca é um local privilegiado nisso, e para quem é fã de um belo balcão o bairro é o paraíso. Estava me dirigindo ao Columbinha mas sem querer dei um olhadela para o lado esquerdo e vi o aconchegante e pequeno Cantinho no Céu, portentoso boteco tijucano que não pisava há tempos. Cruzei a Haddock Lobo e em questão de segundos já estava acomodado numa mesinha de canto, que por sorte é minha predileta. Puxei uma ampola. Ao meu lado um coroa com boné do Flamengo conferia o resultado dos cavalos falando com entusiasmo que apostara no Zatopek, na outras haviam experientes locais que tagarelavam sobre probabilidades de resultados do campeonato nacional de futebol, que estava nas últimas rodadas. Depois dessa analisada no ambiente, examinei rapidamente o quadro com os pratos do dia e depois o que tinha na estufa. Decidi rapidamente por uma bela carne assada com legumes cozidos. A comida simples de botequim é o carro chefe da casa, sempre bem feita e com porções honestíssimas. Os beliesquetes são caprichados também, como as orelhas de porco, que adoro. Pra quem é da casa está liberado ir ao mercado ao lado, caso queira, comprar algo para alegrar o estômago (azeitonas, por exemplo) e consumir no bar. Coisas do bairro. Veio minha refeição, que estava com boa pinta, e para ficar mais bonito pedi a pimenta da casa e um pouco de farofa.




Logo em seguida, apareceu um senhor bem vestido, calça e sapatos sociais, blazer, camisa do Vasco e vários elásticos no pulso direito. Se aproximou e com educação pediu dinheiro para comida. Disse para que sentasse e lhe perguntei o nome. Era Jorge. Aproveitei o momento e perguntei também se ele se importava em almoçar ali comigo. Em poucos instantes comíamos juntos, ele quis carne assada com macarrão. Papeamos, o senhor sabia das coisas, e ele me falou que morava nas esquinas, mas tinha uma uma preferida, a da Afonso Pena com Martins Pena, perto de uma padaria que tem ali. Disse também que ficara surpreso com meu convite pois ela era negro e morador de rua. Conversamos sobre samba, futebol, mulher e outras coisas mais. O Jorge é salgueirense, vascaíno e compositor, cantarolou duas de suas autorias, "Um amor de Jacarepaguá" e "Sina". Me deu uma zombada dizendo que era America também, pois segundo ele todo tijucano é America. Mostrei minha insatisfação, de leve, com tal argumento. Fiquei impressionado com seu amor pela Tijuca, disse-me que gosta de tudo que diz respeito ao bairro. Assim que acabou de comer pediu licença para ir. Lhe ofereci um trocado mas recusou, falou que preferia levar uma garrafa d'água sem gás. Dei-lhe o jornal também, pois queria ler as notícias. Atravessou a rua com aparência de satisfeito e foi embora. Pedi mais duas, vieram mofadas, os coroas da mesa ao lado já tentavam lembrar letra de samba batucando nas mesas, uma senhora passou com o carrinho de feira cheio de compras e o porteiro do prédio ao lado palitava os dentes. Paguei, subi  a ladeira e fui descansar. Salve a Tijuca e o Cantinho do Céu.

Abaixo alguns momentos de nosso papo:







Até.